domingo, 3 de abril de 2011
CLARA E LUÍS
Pensei em não escrever o que se passou, simplesmente porque creio inverosímil que as palavras exprimam o que me sucedeu há duas noites. Afigurar-se-á banalidade. Soarei ridícula. Todavia, a excitação que sinto impele-me a fazê-lo. Deixar suspenso nestas folhas, o que me ficou gravado na memória, indelével. Este corpo que não volta a vibrar inteiro se o não posso ter colado a mim. Reciprocidade com um estranho em encontro fortuito. Podia não ter acontecido. Aconteceu e é, agora, irremediável.
Paro de ler. Sou feito de lágrimas. Não me exprimi quando podia. Por orgulho, receio, ou estupidez. Ouves-me agora? Alcança-te o meu desespero? A urgência em remediar o que não tem conserto? Deitado nesta cama, onde há dias se delineava o teu corpo e ainda “eras”, abandono-me ao desconsolo. À tragédia que se abateu sobre nós que já não podemos existir. A Mariana deve estar prestes a regressar. Folheio mais um pouco a tua escrita que é como quem diz folheio-te e eis que cai a folha dobrada. Perfumaste-a? Ou sonho o perfume teu? É-me dirigida. Porque não a enviaste? Mudaria alguma coisa?
Luís:
Toca a campainha. O tempo concedido passou lesto. Sobreviverei. Estou convicto, porém, que será perene este doer.
- Então Luís, estás bem?
- Não. Mas não te preocupes.
- Queres que te leve a algum lado?
- Não, obrigado. Quero agradecer-te o que fizeste por mim. Foi muito importante teres condescendido.
- Nada fiz de especial. Quem dera que tudo fosse diferente. Também sofro. Cada dia que passa a dor é maior. Espero que com o tempo este martírio atenue.
Depois deste dia não o tornei a ver. Soube, entretanto, que se separou da mulher e partiu em viagem pelo mundo.
Etiquetas: INSANIDADE VOU-ME EMBORA
Free Counter