terça-feira, 16 de dezembro de 2008

 

Coragem e espero que não desapareçam para todo o sempre depois disto:

HAVANA

Olhos tristes.
Mãos estendidas, expectantes.
Uma moeda? (Leva-me contigo.)
Os cães. Apenas cães.
Abandonados, maltratados, mutilados, disformes.
Não muito diferentes das casas. Das gentes.
Cidade fantasma sem o ser.
Os castelos assombrados, habitados por pessoas que não lhes podem fugir.
Pessoas que nos olham sem esperança.

- O meu sonho era ver neve.
- Qualquer dia pode ser que vejas.
- Não posso. Não tenho visto.
- Nunca se sabe! Qualquer dia!
- Não podemos. Não temos visto.
- Ouves-me? NUNCA SE SABE!
- Não posso. Não tenho visto.


(Não acreditam ser possível a mudança. Não é hipótese plausível. Não é sequer concebível)

Que fazer com a saúde gratuita, a educação gratuita e a cultura gratuita (Cultura? Haver nas livrarias apenas livros acerca do Che, do Fidel, da revolução. Apenas livros desses? E os outros? E tudo o resto a que as pessoas têm o direito de ter acesso para poder saber o que querem, ou não querem, com consciência? Em que é que esta atitude censória difere do que se passava cá antes do 25 de Abril.) se não há liberdade para pensar diferente, para fazer diferente, para ser quem se quer ser. Que fazer quando o limite não é o céu, mas uma ilha com poucos quilómetros quadrados.

12.000.000 de prisioneiros.

Quantos não desertariam se pudessem? (Quantos não tentam. Quantos não morrem.)
Quantos?
Quantos não olham para nós, os de fora, como numa prece?
Uma prece muda feita com o olhar.
A ânsia de saber, conhecer, perguntar.
E ainda assim, o não falar. O medo. O não falar.
Não é preciso que nos contem para o ver.

Não aguentaria mais um dia n(est)a cidade.

Há seis anos, o deslumbramento. O fascínio pelos carros antigos, pelas casas coloniais imponentes paradas no tempo.

Uma estagnação atroz. Vi agora.

Passado o deslumbramento de há seis anos, uma estagnação atroz, uma lavagem cerebral em massa, uma agressão constante ao que penso. Ao que acredito.
Os cartazes gritam BLOQUEIO CULPADO.

E para mim, para mim que sou uma pessoa básica (nunca me ouviram dizer ser complexa ou dotada de grande inteligência) há muito que o problema já não é “apenas” o bloqueio.

Há muito que a conversa do papão deveria ter deixado de fazer sentido. Não digo esquecer o passado, importante, vital, devendo permanecer indestrutível nas mentes das gentes. Digo: pensar no futuro. Digo: não abandonar o povo à sua sorte, bombardeando-o com parangonas saudosistas e revivalistas. Sim tudo foi importante. Não digo que não. Mas e o HOJE das pessoas? Como fica?

50 anos de uma mesma pessoa a governar não é bom para qualquer país.

Ao fim de 50 anos passar-se o poder para um irmão, não é de um país livre.

Não é uma governação saudável.

Não vejo diferença para outros regimes que abomino.

Não querendo subestimar a capacidade (Questionável: a que preço? A que preço?) que tiveram para sobreviver ao bloqueio pergunto: vive o Fidel e sua família nas condições de precariedade do povo? Vivem? Não me parece. Mais um caso, portanto, em que são sempre os mesmos a sofrer, com a agravante de não poderem fugir, de não poderem escolher.

E eu que sendo simples, sendo básica (ingénua ou o que queiram) jurei a mim mesma não entrar no Campo Pequeno enquanto lá se realizarem touradas. Juro agora, não voltar a entrar em Cuba, enquanto não se respirar novamente LIBERDADE.


CAYO LARGO

A NATUREZA: um paraíso na terra. Águas límpidas, azul-turquesa. Os animais aqui e ali sem dar por nós. O céu azul imenso (como cá, é certo, mas noutra envolvência). O verde. E ao longe, ao longe apenas mais natureza, mais paz, mais mundo puro, quase intacto.

O HOTEL: o ambiente mais superficial e artificial que já vi. A simpatia, o brio no trabalho, o contacto interpessoal pagam-se e bem. Não dás moedinha não és ninguém. Não existes sequer. Olha, metam esse tipo de simpatia num sítio que eu cá sei (Bzuu isto às vezes dá mesmo jeito. Eh eh.). E não deixei de dar “gorja” a quem me mereceu semelhante gesto, porque sim eu compreendo a situação e sim gosto de ajudar quem precisa. Agora lambe-cús profissionais, sejam de que nacionalidade forem e seja qual for o contexto em que se inserem metem-me “nuojo” (como diz o “eddie” nos caixilhos). E eu gosto pouco de andar nauseada.

A LEITURA: “O Estrangeiro” – Albert Camus. Comecei a ler este livro com alguma desconfiança. Comecei por pensar acerca do Meursault – a “pessoa” central – Que parvalhão. Fiquei com medo: Queres ver que agora me deu para estar contra os escritos dos grandes vultos da literatura? E depois a surpresa. Saíram de dentro do livro os (tais) braços que sempre anseio nas minhas leituras, que me levem para dentro dele e estes levaram-me para o pé do Mersault e deixaram-me viver a sua (não) história, perceber a (não) mensagem que me quis transmitir. Sim. O que vos transmitiu/irá a vocês é lá convosco, com as vossas sensibilidades e com as vossas experiências e sabedoria. Essas modificam-nos o peito, e deturpam a nossa visão e a forma como recebemos as informações é inevitavelmente diferente. Ora, a mim, este livrinho tão pequeno, singelo (falando apenas em número de páginas), tão maravilhosamente e de forma hábil condensado, falou-me da relatividade de tudo o que vivo. De como as coisas têm apenas o peso, o valor, a importância que lhes quero (consigo) atribuir. De como posso ver o belo e o horrendo na mesma atitude. De como posso sentir desespero, alegria ou ficar indiferente, relativamente a um mesmo evento. A minha mente tudo controla. E posso deixar que a minha mente seja soberana (é possível uma perfeita independência de pensamento?), ou posso viver o que os outros (os da minha vida, a sociedade, milénios de história) “programaram” para mim. É tudo muito relativo. É tudo passível de ser observado/vivido/sentido/não sentido sob diversas perspectivas. E no fundo, que interessam essas perspectivas se o fim é sempre o mesmo. O mais indiferente dos seres, o mais acomodado, aparentemente amorfo e desprovido de desejos, pode, num momento derradeiro, ansiar que não o ignorem. Desejar ser diferente do que foi até então. Recomeçar. Reinventar-se. Pode querer com todo o ardor, que nesse momento de expiração, mais do que o amem (o que quase todos procuramos em vida, que nos amem) que o odeiem profunda e exultantemente. E isso não é, no fundo, condenável. O que é condenável afinal? Onde se encontram os nossos limites? (Verdadeiramente) Em nós? Ou no que nos incutiram desde o ventre?

MUITO BOM. A NÃO DEIXAR de LER e RELER (eu vou relê-lo).

Isto sem vos querer impingir o que quer que seja. Claro.

(Ainda aí estão? Já tinha saudades!)

(Less is more. Aprendi não há muito. E concordo. E hei-de aplicá-lo em muitas ocasiões. Hoje não deu. Desculpem a seca. Psst psst. Limpem a baba ao campo da boca, levantem a cabeça do teclado. Já acabei!)

Deia’s back.

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Comments:
Grande post, Grande Andreia :)

(pssst, vais emprestar-me aqueles braços?)

bjs
 
Claro que sim! Amanhã já tos levo. Bjinhos :)
 
bzuuzinha...bem vinda!!!!
ja tinha saudades de te ler...e nao...nao me babei nem bati com a cabeça no teclado :D
pois é...senti que viste uma cuba diferente da que vimos...a cuba é a mesma, mas o desconhecido de há 6 anos já nao o é e a idade é outra...agora olhamos com outros olhos :(
mas mailogo falaremos sobre isto pessoalmente...
ahh e tambem quero ler o Camus...mas ja sei que estou na fila...é o que dá nao ser a primeira a comentar eh eh :))
beijo amiga e até jáaaaaa
 
eh eh. Até já! bjitos
 
.... bem..... se comparares Cuba com outros países da América do Sul, ter saúde e educação já não é nada mau...Porque outros como o Mexico ou o Brazil (que até são muito maiores) têm liberdade, democracia e governos a mudar de tempos a tempos, mas também têm a maior divisão de classes que existe no mundo, onde se nasce condenado á partida (ou rico ou pobre) e o máximo a que se pode aspirar é ter um empregozinho como mordomo numa cadeia de hoteis onde pessoas como nós podem disfrutar da nossa liberdade e do mundo fantastico onde vivemos....
descupla mas não reisiti.
Beijo Grande

ps. Não sei se já sabes....... mas já vem outro a caminho :)
 
Mas têm a HIPÓTESE de contrariar o destino.

1 nome: Seu Jorge. Foi sem-abrigo. E hoje?

Pode-se sonhar pelo menos. Pode-se pensar em... Sonhar com... Pode-se até fugir, sair, procurar outros rumos. Pode não se conseguir, mas há pelo menos 1 hipótese. Podem-se eleger as moscas e não ser sempre as mesmas a sobrevoar a merda.

Em Cuba pouco mais podes aspirar do que ser:

1) prostituta
2) passo a citar-te: "mordomo numa cadeia de hoteis onde pessoas como nós podem disfrutar da nossa liberdade e do mundo fantastico onde vivemos"
3) trabalhar na reconstrução dos poucos prédios em recuperação
4) ser feirante
5) passar o dia à janela

É assim tão diferente? E nesses...(Brasil e México) Nesses os cidadãos podem sair do seu país e retornar se quiserem. Podem não ter recursos para o fazer, mas poderiam fazê-lo. Têm essa hipótese. E é muito triste viver sem poder sonhar, sem se acreditar que é possível a mudança.

Oh menino então não sei! Dei-te os PARABÉNS no Pingo Doce!! Não te lembras? Tenho saudades vossas. Tenho de ligar à tua menina mais velha a combinar.

Bjs
 
Ora bem vinda aqui as lides da escrita. Também já tinha saudades de te ler!
Agora falta por a outra leitura em dia!

Pois, p*ta de consciência e cabr*o do conhecimento que não nos deixa leves e indiferentes! E ainda bem a meu ver. É um ponto sem retorno e a responsabilidade pesa. Mas também não nos podemos levar muito a sério.

Beijo grande com saudades.

G

*tumbl (curioso não?)
 
Levarmo-nos a sério? Estás a falar de quem? eh eh

Bj gd e até 6F

(estou "logada" não tenho curiosidades para ti)
 
Então e os Orishas.... são cubanos...e o pessoal que costuma tocar com o Luís Represas também é cubano.

Mas pronto. Onde eu queria chegar era, que o Brasil e o México, que supostamente são países livres e democráticos (e com 1000 vezes mais recursos que Cuba e sem embargos) não conseguem fazer grande coisa pela maior parte das pessoas que lá vive (nomeadamente na saúde e na educação), e no entanto são países onde há uma minoria de milionários a quem tudo é permitido.

Eu não sou defensor da revolução cubana (comunista muito menos), mas se olhar para América do sul e começar a pensar como será a vida em países como o Perú, Panamá mais outros países do tamanho de Cuba e puser tudo nos pratos da balança, não sei se ela fica assim tão desequilibrada para o lado dos "países livres", e parece-me sempre que Cuba é o patinho feio dos países pobres.

Para alem disso, Cuba só é um pais importante exactamente porque tentou mudar alguma (ainda que mal...) se não seriam tão insignificantes como Haiti ou a Costa Rica... e se pensares um pouco sobre isto, vais ver que somos muito mais exigentes com Cuba do que com o Haiti... e isso não tem razão de ser.

Ps. Já não me lembrava do Pingo Doce..... a minha memória de curto prazo está ao nível de um chiuaua.
Combinem lá um "lanchinho" para assim resolvermos de uma vez por todas o problema da pobreza no mundo (ou só na america do sul, se estivermos pouco ambiciosos)
 
Os atletas olímpicos tb vão aos jogos olímpicos e depois voltam, se não voltam não poderão voltar mais. E é um direito consagrado na carta dos direitos humanos a pessoa poder abandonar o seu país e regressar sempre que quiser.

Eu tb não sou especificamente contra Cuba, tb me insurjo e tb me revoltam as injustiças e afins nos outros países. Estava só a relatar o que vi/senti em Cuba e relatei a revolta que me inspiram esses países em que há um regime ditatorial. Revolta-me esse assunto em qualquer parte do mundo e em qualquer época e não apenas Cuba. Não me contaram. Não me impingiram ideias. Foi o que vivi lá. Se eu fosse ao Haiti e visse o que vi em Cuba lá terias aqui um post sobre isso. Eu não me rejo por opiniões políticas, são opiniões pessoais/sentimentais acerca do que vivo. Apenas isso.

Quanto ao lanchinho era bom ser antes do Natal. A ver vamos. E dia 20 vou tentar ir ver-te pela 1vez ;)

Bjitos
 
pronto... cá fico á espera que vás ao Haiti :)
 
hi hi hi hi hi
 
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