quinta-feira, 28 de julho de 2011

 

NOVAS CARTAS PORTUGUESAS na GERAÇÃO-C

Eis um texto falhado porque não faz juz nem ao que senti ao ler este livro, uma preciosidade, nem ao tanto que a sua leitura me enriqueceu. Nele descobri que sou feminista e aqui me assumo, correndo o risco de me chamarem histérica queimadora de soutiens, ressabiada e outros apupos que tais. Quem assim fala desconhece a matéria e como tal, não merece que sequer se inicie discussão séria, porque já fechou os olhos de dentro a realidade(s) que lhe(s) é (são) alheia.

«Não posso ir sem autorização escrita de meu marido, pai ou irmão.»; «Não me deixaram estudar.»; «Queimaram-me viva. Disseram: és bruxa. Atearam o fogo rindo.»; «Espancou-me violentamente. Diz que me portei “mal”. Que uma senhora não (re)age “assim”.»; «Violou-me meu pai. Minha mãe ordenou que me calasse. Chamou-me: imoral.»; «Meu marido afirmou: Estás louca. Sentenciou: Internem-na. Aqui estou sã num hospício. Ele vive com a amante.»

Situações ficcionadas (verídicas) que agridem, não tão remotas que as possamos, de ânimo leve, olvidar. Algumas vívidas, ainda. Embrenhei-me de forma avassaladora neste livro. Tem sido algo ignorado, no nosso país, desde que foi publicado em 1972. É lamentável. Com ele compreendi muitas coisas sobre mim, os outros e a sociedade em que me insiro. O que mais me impressionou foi a coragem das três escritoras que o criaram, a três mãos, em 1971. Tendo-se reunido em Maio desse ano demoraram nove meses a erigir esta obra(-prima). O tempo de uma gestação, de onde também nasceu uma sólida cumplicidade. Arriscaram a posição enquanto autoras já conhecidas e as próprias vidas. Jamais revelaram quem escreveu o quê. No contexto da ditadura, que terminou há 37 anos, imaginem o que foi três jovens mulheres – Maria Isabel Barreno (1939), Maria Teresa Horta (1937) e Maria Velho da Costa (1938). – escreverem sobre sexualidade, vontade(s), liberdade(s) e revolução(ões). Reivindicarem o direito a muito mais do que serem somente esposas, domésticas e mães. O direito a serem (fazerem) o que almejassem. Para os homens, por exemplo, o direito a recusarem-se participar numa guerra sem sentido. Denunciaram todo o tipo de injustiças e não apenas as perpetradas contra o género feminino. Foram injuriadas, apontadas, julgadas por pornografia. Só o 25 de Abril de 1974 evitou que fossem presas.

Como fio condutor encontram-se as “As Cartas Portuguesas”, romance epistolar publicado em 1669. Nesse Mariana Alcoforado, mulher enclausurada freira num convento de Beja, remete ao cavaleiro de Chamilly cinco cartas inflamadas de amor e ódio, recordando a paixão com ele experimentada. Daí emanam inúmeras histórias de Marias, Marianas, Marias Ana, Mónicas, entre outras, na forma de poemas, cartas, micronarrativas, citações ou jogos de palavras, não se cingindo, ao longo das 307 páginas, a um género literário.

Não se trata de um livro exclusivamente feminista, ou sobre a condição feminina, como à primeira vista se poderá afigurar. Antes de um manifesto contra todo o tipo de tirania(s) e discriminação. Que ao evidenciar-se as dissemelhanças se encontre um caminho não tanto para a igualdade - Utópica quando o que está em causa é a natureza díspar de cada ser humano. - quanto para o direito à diferença de todas as mulheres e de todos os homens. Continua, por conseguinte, por demais actual.

195 BPM - Esta edição anotada (Dom Quixote 2010) resulta do trabalho de Ana Luísa Amaral e da sua equipa de investigação, que nos devolveram um documento único e vital para compreender parte do mundo em que vivemos. Fica o repto: adquiram o livro e sugiram-no aos amigos. É (a nossa) história. Com o conhecimento mudam-se mentalidades e é às gerações mais jovens que compete boa parte dessa mudança.

Fontes de informação factual:

- Breve Introdução – Ana Luísa Amaral em Novas Cartas Portuguesas – Edição Anotada (Dom Quixote, 2010.)

- Ípsilon, suplemento do jornal Público, de Novembro de 2010.


CURIOSIDADE:
Falaram deste livro na 3ªF no "Conta-me como foi." Giro, pois é? Pois é.

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Comments:
Um beijo de admiração à minha feminista do coração.
Ser feminista é uma questão de direitos humanos. Digo eu, que também tenho a minha parte feminista. Humanista.
 
Retribuído meu Amor! :)
 
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